A igreja de São Gabriel
Eu não sei se a igreja de São Gabriel é uma igreja triste numa rua feia, ou se é uma igreja feia numa rua triste. Provavelmente seja os dois, o que me faz ter um pouco de simpatia por ela.
Espremida na calçada estreita da avenida cinza, cinza também ela, com uma grade na frente e um átrio frio e sem expressão, a igreja não transmite o calor nem o conforto que as igrejas deveriam transmitir.
Pelo contrário, ela permanece distante, como se pouco se importasse com os fiéis que a procuram em busca de paz ou apenas para rezar.
Quem sabe seja por isso que eu não me lembro, de, em toda minha vida, ter assistido um casamento na igreja de São Gabriel.
Pelo contrário, minhas lembranças da igreja são todas tristes, todas de missas de sétimo dia, de última despedida de gente querida, de conhecidos que Deus chamou para viverem eternamente no seu imenso seio.
Normalmente as igrejas chamam a atenção de quem passa perto. A exceção fica por conta das igrejas humildes, como a igreja de Santo Antônio, escondida no largo do Patriarca. Só que a igreja de São Gabriel não é pequena, nem humilde, e no entanto, quando a vejo, passando de carro pela avenida suja e triste que leva à Santo Amaro, tenho a sensação de que ela, mesmo grande e alta, destacada na paisagem suja e triste como a avenida, gostaria de se esconder.
De não se mostrar, ou de chamar menos a atenção, como se percebesse a distância enorme entre o brilho de seu santo padroeiro, o fulgurante arcanjo Gabriel, e o traço do seu arquiteto, que não percebeu que ela deveria ser alegre e brilhante para homenagear a glória do guerreiro de Deus.
Triste, numa rua feia; feia, numa rua triste, a igreja de São Gabriel merece o nosso carinho e a nossa ternura. Sem querer, ela nos faz pensar no sentido da vida porque é o retrato de grande parte do mundo.
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