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A genialidade ao alcance de quase todos

Ser gênio, nas ruas de São Paulo, dentro dos conceitos vigentes, em que gênio é quem faz o que quer porque é legal fazer o que se quer, é fácil. Não requer prática nem experiência. Um pouco de falta de educação, um pouco de barbeiragem, um pouco de burrice e pronto. Está formado mais um gênio das ruas.

Entre os que mais se destacam, pelo menos no meu caminho matinal, está o tipo que eu chamo do politicamente quase correto. O referido motorista vai feito uma lesma, a passo de cágado, rua acima ou rua abaixo. Nada o faz mudar de velocidade porque ele está convencido que é andando devagar que se vai ao longe. Mais grave do que mudar de velocidade, nada o faz ir para qualquer dos lados. Ele anda bem no meio da rua, independentemente da sua largura, impedindo quem quer que seja de tentar ultrapassá-lo. Seja pela direita, seja pela esquerda, a rua é sua e ponto. Ambulâncias, carros de bombeiros, polícia e até ladrões, todos, mas todos mesmo, têm que se sujeitar ao seu ritmo e deixá-lo fazer o que quer, porque é politicamente correto, ou quase, andar assim.

Mas eu exagero. Tem uma situação em que o motorista politicamente quase correto acelera. E aí ele acelera mesmo, se precisar vai até cem ou mais, impávido e perigoso, mas agora para quem vem pela outra rua, para quem o sinal está abrindo.

O tipo em questão não pode ver sinal mudando de cor, que ele corre. Durante a rua toda ele foi a menos de trinta por hora, sem ninguém na sua frente e até sem buracos, vendo o semáforo lá longe verde para ele. É só a luz ameaçar mudar, é o amarelo acender, que ele sai feito vaca brava, desembestado rua a fora, para passar de qualquer jeito, normalmente já no vermelho, porque ele é esperto e não perde sinal.

Aí ele acelera. Pé na tábua que a rua é minha e eu não vou ficar esperando o sinal abrir de novo. Eu passo e pronto. Se vem outro já no verde que se dane.

Eu passo e pronto!

O motorista politicamente quase correto é dono da rua. Ele pagou o IPVA, portanto ele passa e pronto.

Não lhe ocorre andar um pouco mais rápido durante o trajeto normal. Tão pouco lhe ocorre andar de um lado ou do outro da rua. Ele anda no meio, segurando o trânsito inteiro, indiferente e, às vezes, até indignado, ao som de uma buzina. A única coisa que o faz correr é o sinal amarelo. Aí, nem Deus o segura. Ele é o Fangio reencarnado.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.