Um telefonema da fome
O Brasil tem perto de quarenta milhões de cidadãos em situação de vulnerabilidade para a fome. Dados como esse nos envergonham, despertam a solidariedade, mas não ferem os corações e as mentes.
São abstratos, teóricos, assépticos, absorvidos dentro de casa, sentado numa poltrona vendo TV, lendo o jornal, ouvindo um podcast. Não mexem com os sentidos, não afetam a visão, a audição, o olfato ou o paladar. Simplesmente estão ali, diante dos olhos, como mais uma informação, como a guerra da Ucrânia ou um terremoto de 6,5 graus.
Nós sabemos que temos que fazer alguma coisa, fazemos dentro do possível, mas estamos longe de resolver o problema, até porque, sem o governo, não há como fazer isso. Sem mexer na base não há como mudar o quadro. Sem saúde e educação não tem solução de longo prazo e a realidade não vai mudar.
Todos sabem que as ações são urgentes, mas a urgência mais urgente para quem decide o destino das verbas é abastecer o orçamento secreto, desviar verbas públicas, voar de jatinho pago pelo povo, trocar a frota da casa porque autoridade tem que andar de carro de luxo novo.
De repente, quando ninguém espera, a porrada vem de onde ninguém espera. Um telefonema muda o curso dos acontecimentos, envergonha a nação, bate fundo no fundo do peito, traz pra luz o que estava debaixo dos viadutos, nos barracos das comunidades, na miséria andando pelas ruas.
Um menino telefona para uma delegacia de polícia em Belo Horizonte para pedir ajuda porque a família estava passando fome. Há três dias a família passava fome e a mães chorava porque não tinha o que servir para os filhos. A situação era dramática, por isso ele estava telefonando para pedir ajuda. Quantas crianças gostariam de telefonar pedindo ajuda?
O que os candidatos pretendem fazer para mudar essa vergonha?
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