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O abandono do cemitério

[Crônica do dia 3 de junho de 1997]

Uma das formas empregadas para medir o progresso humano é o respeito aos mortos. Sinal claro de avanço na rota da civilização, o respeito aos mortos, o grau de sofisticação nas cerimônias fúnebres, tem servido de parâmetro para medir o grau de evolução dos povos ao longo do tempo.

Provavelmente nenhuma civilização dedicou tanto espaço e tanto tempo ao tema quanto os egípcios. Suas pirâmides e seu vale dos reis, com tumbas tão ou mais ricas do que as de Tutancâmon, dão a medida do respeito que os mortos mereciam e de como era forte a crença na outra vida.

Mas não são só os egípcios antigos que cultuavam seus mortos. Povos tão primitivos quanto os índios brasileiros ou os aborígenes australianos também enterram seus maiores, homenageando-os e preservando-lhes a memória.

A crença numa outra vida é um traço marcante em todas as civilizações. Desde as mais simples e primitivas, até as mais avançadas, todas de uma forma ou de outra cultuam seus mortos, preservam o seu passado.

É verdade que desde que os mortos são enterrados os vivos violam seus túmulos, normalmente atras das riquezas enterradas junto.

O que não é comum é membros duma mesma tribo violarem os túmulos de seus antepassados.

Pois é isto que acontece em São Paulo. O roubo de túmulos é estória antiga nos cemitérios da cidade, com as sepulturas sendo violadas faz tempo, atrás das mesmas riquezas que há séculos atraem ladrões que acham, com uma certa justiça, que o ouro e a prata foram feitos para serem gastos aqui mesmo.

O que não é compreensível é alguém pular o muro dum cemitério para pichar túmulos.

E é isto que lamentavelmente acontece no Cemitério da Consolação, onde mais de uma estátua de Victor Brecheret e de outros artistas famosos estão pichados por gente que não respeita nem os mortos, nem a arte.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.