As curvas ao contrário
[Crônica de 23 de fevereiro de 1998]
São Paulo é uma cidade diabólica. Capaz de ações inacreditáveis, desde a sua fundação ela se esmera em fazer tudo ao contrário e a prova viva disto são as curvas de suas ruas, ou melhor, a inclinação das curvas de suas ruas.
Uma leve olhada nelas é suficiente, até para quem não entende nada de engenharia, ter certeza de que alguma coisa está profundamente errada e que do jeito como foram projetadas a tendência lógica é o carro capotar e não ficar firme, como se espera de uma curva bem desenhada.
As razões que levaram as nossas curvas a serem tão mal executadas são um dos grandes mistérios que fazem mais atraente os meandros dos corredores secretos onde as grandes decisões são tomadas.
Faz tempo que o Dr. Ardevan Machado grita contra o traçado sem sentido que mata tantos, ao longo de tantas curvas que infestam as ruas da capital.
E, no entanto, como sói acontecer com mais frequência do que seria desejada ao longo de toda a história do homem sobre a Terra, seus gritos ecoam no enorme deserto dos ouvidos surdos ao bom senso e ao razoável.
Gritar não adianta, como não adiantou a lei que obriga a prefeitura a refazê-las em prazo já vencido e nunca cobrado, sem que ninguém fosse responsabilizado ou ao menos inquirido sobre os por quês da omissão.
Todavia o mistério permanece, como permanecem as construções invertidas que fazem com que as curvas se inclinem quase sempre para o lado errado, jogando os carros para fora, em vez de prende-los ao asfalto, melhorando-lhes a aderência e a segurança.
O que leva alguém a construir ao contrário? Será que há uma diferença de preço quando a curva inclina para lá em vez de inclinar para cá?
Não tem sentindo pensar nisto, assim, só me resta acreditar nas bruxas e que as curvas paulistanas são ao contrário por obra e graça delas, que acham o máximo ver os carros derrapando desgovernados baterem de frente nos muros.
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