A cidade no escuro
[Crônica de 5 de julho de 1999]
São Paulo, além de escura está no escuro. Por alguma arte que ninguém sabe bem qual seja, a cidade simplesmente está com um número impressionante das luzes de suas ruas apagadas.
E não cabe nem dizer que é ordem de alguém para se vingar de outro alguém, a não ser que a vingança seja generalizada, e a raiva do mandante abranja toda a área metropolitana, ou toda a população, que, com certeza por não entender o que o alguém queria, fez o contrário.
Faz tempo que São Paulo não ficava tão no escuro como está. É verdade que na rua que eu moro, bem em frente da minha casa, tem uma lâmpada queimada faz mais de um ano, mas minha rua é uma rua pequena de bairro, rua pobre no contexto urbano, sem importância para ninguém, exceto para quem mora lá.
É só por isso que não trocam a lâmpada queimada… Quer dizer, eu achava que é só por isso, mas, depois que a prefeitura inovou, fazendo testes com um asfalto novo, que é pior do que o asfalto velho, começo a ficar em dúvida.
Pode ser que a lâmpada da minha rua não tenha sido trocada de propósito, para criar um ambiente novo, que reproduza o ambiente do final do século passado, que, segundo os cronistas da época, era mais amável com o ser humano.
Se for por aí, estamos, todos os que moram na minha rua, estrepados. Com uma administração municipal como a que temos hoje, com certeza a vaca vai por brejo, quer dizer, nossa pouca qualidade de vida, permanentemente atacada por travestis, prostitutas, caminhoneiros desembestados e enchentes até nos meses seco, vai piorar e muito.
Só que a ameaça que pesa sobre nós é muito maior do que a minha rua ficar com cara de São Paulo do século passado. A cidade inteira corre este risco. Começo a desconfiar seriamente de que há uma relação estreita entre os milhares de buracos que infestam nossas ruas e as lâmpadas apagadas ao longo delas. E o duro é que com a poluição do inverno nem um céu mais bonito nós vamos ter.
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