O tempo passa e muda tudo
[Crônica de 5 de setembro de 2000]
Vinte anos atrás o centro velho de São Paulo parecia um formigueiro enlouquecido, com milhões de pessoas cruzando suas ruas estreitas todos os dias. Andar pelas ruas São Bento e José Bonifácio chegava a ser desagradável pela quantidade de gente em quem a gente esbarrava ou dava encontrões, por falta de espaço para desviar.
No meio dessa loucura, os camelôs, que já existiam e tinham uma graça que não têm hoje, vendiam seus produtos, sempre com medo do rapa da prefeitura que quando vinha era para valer e, sem ajuda da guarda municipal, tirava os homens das ruas e apreendia suas mercadorias.
Era comum se ver no viaduto do Chá uma pilha de traquitandas apreendidas, amontoadas no chão, enquanto fiscais e camelôs tentavam se entender, os primeiros surdos e os segundos pedindo pelo amor de Deus para ter suas mercadorias de volta.
Nessa época, a rua direita, muito embora não tivesse mais um comércio fino, era um dos grandes centros comerciais da cidade. Não tinha loja nela que não ganhasse muito dinheiro, e as Lojas Americanas, sempre lotadas, eram o seu símbolo.
Os restaurantes tinham fila na porta e a espera, dependendo do dia e da hora, podia ser bem longa. Por isso era importante ser amigo do maitre ou de um garçom com bom trânsito na casa. Era o melhor jeito de impressionar seus clientes, que ficavam admirados com este tipo de influência.
Foi também a época dos grandes sanduíches. O Maranduba, o Guanabara e a Leiteria Paulista faziam sanduíches imbatíveis, que não podem ser comparados com os de hoje em dia, vagamente parecidos, mas que nem de longe lembram o que eles eram.
E a gente fazia fila, amontoados nos seus balcões, para comer um inventado, de pé, empurrado e sem conforto, mas achando ótimo.
Hoje o centro velho não tem mais nada disso. Ele é cinza, vazio e triste, como um fantasma que não sabe que virou fantasma.
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