Os rios mudaram de curso
Os rios de São Paulo mudaram de curso, ou melhor, mudaram o curso dos rios de São Paulo. Originalmente cheios de curvas, espalhados pelas várzeas, o Tietê, o Pinheiros e o Tamanduateí serpenteavam lentamente no seu rumo de rios ao contrário, entrando sertão adentro pelo leito original do Tietê, que passava Santana do Parnaíba para se afundar na direção de Itu.
A pouca queda do terreno garantia que escorressem devagar, sem pressa, no ritmo da poesia da vida que se desenrolava no amplo planalto. A cidade era pequena, depois cresceu, se espalhou fora de controle, abriu ruas e avenidas e acabou tendo a ideia de corrigir o leito dos rios, mudando o curso natural em favor de três longas retas, que não dão conta das águas na época das chuvas, deixando que elas se espalhem pelas várzeas ocupadas e tomem de assalto casas, ruas e avenidas, levando com elas os sonhos das vítimas e as lembranças de outro tempo, quando os rios corriam no ritmo da natureza.
Mas os homens querem sempre mais, querem mandar mais, coordenar o ritmo da vida pelo ritmo alucinado da vontade de fazer, sem saber muito bem o quê.
As fotos antigas mostram os rios fazendo curvas pela várzea. A Ladeira Porto Geral tem esse nome porque era ali que ficava o porto do Rio Tamanduateí , por onde chegavam mercadorias e alimentos para a cidade.
As marginais não existiam. As águas corriam pela várzea impermeabilizada por elas, inundavam amplas áreas vazias e se perdiam nas distâncias ou engolidas pelo solo.
Só que São Paulo não pode parar. A cidade que mais crescia no mundo tinha um compromisso com a pressa. E a pressa foi sua marca registrada até ser aprisionada pela enorme serpente do trânsito, alimentada pela incompetência da CET. Hoje, a cidade inunda e não tem o que fazer.
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