Eu vivi atrás do muro
[Crônica de 2 de dezembro de 2009]
Eu morei em Berlim Ocidental em 1978. Dez anos antes dos 20 anos que estão sendo comemorados agora. Era uma cidade fascinante, com uma vida cultural maravilhosa, cercada por uma muralha, como um anel que a abafava por todos os lados.
Você entrava numa avenida e, de repente, sem aviso, lá estava ele, normalmente cinza, padronizado em blocos pré-construídos, impassível e dramático, interrompendo a rua como se o mundo fosse dele, e a ideia dos tanques russos a certeza de que qualquer amanhã poderia não ter mais certeza nenhuma.
O muro era muito mais complexo do que uma simples muralha de concreto com alguns metros de altura. Em alguns trechos, aproveitava velhos prédios com as janelas cimentadas, em outros, campos minados e cercados com arame farpado impediam a passagem. E em boa parte de seu perímetro não era um, mas dois muros, com um espaço no meio, com arame farpado, cães, carros armados, torres com metralhadoras e minas terrestres espalhadas pelo chão.
Fugir era no mínimo muito difícil, e muita gente perdeu a vida tentando. Ao contrário dos filmes americanos, que mostravam os alemães orientais como incompetentes, na prática, as forças de segurança matavam ou recapturavam os que tentavam fugir com enorme frequência.
Mas a viagem para Berlim Oriental, ainda que na primeira vez dando medo, valia a pena. Os melhores museus alemães estavam do lado russo, e ver a destruição causada pela guerra era impressionante. Mesmo do lado ocidental os estragos nos prédios mais velhos ainda eram visíveis.
Mas o medo do muro e as marcas da guerra eram compensados pelo ritmo da vida, pelos shows, concertos e muita adrenalina.
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