Calor das profundezas
Minha avó definia o calor dos dias mais quentes como africano. Quando ficava mais quente ainda, ela dizia que o calor era abissínio.
Só que neste verão o calor tem ultrapassado todo e qualquer limite civilizado ou não civilizado, atingindo pontos próximos da ebulição da água, ou coisa parecida, o que minimiza a definição abissínia.
Quando eu estudava no Colégio Dante Alighieri, me mostraram uma fotografia que eu nunca mais esqueci. Uma pessoa fazendo ovo frito na calçada da praça da Catedral de Milão.
Não tenho dúvida de que, se alguém tentar, São Paulo não ficará devendo nada à cidade italiana. Com o calor que tem feito, fritar ovo na Praça da Sé só não dará certo se alguém roubar o ovo antes do preparo terminar.
Como abissínio não define mais o calor deste verão, pensei em falar em calor etíope. Afinal, a Etiópia é o lugar mais quente da Terra.
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O problema é que minha avó, muitos anos atrás, já estava certa: Etiópia e Abissínia são o mesmo país. Um é o nome novo, o outro, o nome antigo, quando a Etiópia tinha imperador que atendia por Negus.
Ora, se a invocação do lugar mais quente da terra não define mais o calor bárbaro que tem feito em São Paulo, a solução é sair da Terra, ou melhor, mergulhar em suas entranhas e buscar inspiração no reino de Satanás, onde o fogo eterno consome as almas pecadoras, queimando noite e dia, incessantemente, em temperaturas para lá de extremas.
Isto posto, a partir de hoje, nos dias mais quentes, definirei o calor como calor das profundezas, numa justíssima homenagem ao Príncipe das Trevas e ao calor indescritível que corre solto em sua casa.
Além disso, volto a um tema que merece mais estudos. Ninguém me convence que Deus e o Diabo não fizeram um pacto para punir os pecadores em vida e aliviar o inferno. Se for verdade, o calor está explicado.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.
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