Acho que morri
Primeiro foi um barulho longe, como se as forças afegãs avançassem madrugada a dentro, bombardeando São Paulo, para um assalto coordenado por forças rebeldes lutando contra os rebeldes.
Depois ele percebeu que era só o telefone e que o barulho aumentava porque tinha ido dormir tarde e não fazia tanto tempo que se deitara.
Virou-se para o lado, tateou no criado mudo, achou o telefone e atendeu com voz de sono: – Alô!
– A voz do outro lado falou: Meu amigo, sou eu. Estou telefonando porque é uma emergência. Você tem tempo para me ouvir?
– São quase cinco horas da manhã, mas ok, eu tenho um tempo e, pela sua voz, a emergência deve ser séria. O que aconteceu?
Com voz grave o grande professor de medicina respondeu: Pasme! Eu acho que morri. Melhor, estou com todos os sintomas de ter morrido e confesso que não sei como agir, o que fazer. 00Como você, além de meu grande amigo, é um grande advogado, estou telefonando para saber o que eu devo fazer.
O inusitado da conversa fez ele perder o sono. Sua cabeça pensava rapidamente, analisava as alternativas e o telefonema lhe parecia cada vez mais absurdo. Não, não era trote, ele conhecia a voz do amigo. Era ele quem estava do outro lado. Mantendo a calma ele disse: – O que te leva a crer que você morreu? Afinal, você é dos maiores médicos do país. Como você concluiu que você morreu?
– Pois é, pode parecer incrível, mas acordei agitado e quando fui tomar meu pulso, descobri que estava sem pulsação. Eu morri! Você entende? Sem pulso, eu estou morto!
A resposta foi direta: – Se você morreu, como está falando no telefone? Você já viu morto falar? Desligou o telefone e voltou a dormir.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h00