Imponderáveis
Sentado no sofá da minha sala, assistindo televisão, comecei a prestar atenção no EPIRB do “Mar Sem Fim”, dentro de sua caixa de madeira e vidro, colocado na estante em cima da TV.
A viagem do aparelho foi longa e completamente inesperada. Nunca, um ano antes, me ocorreria que um dia eu teria um EPIRB na sala da minha casa e que o EPIRB que enfeita minha estante seria retirado do fundo mar, depois de um ano naufragado na Antártica.
Os caminhos desta vida são estranhos. O EPIRB é um aparelho destinado a marcar o local do naufrágio, emitindo sinais para serem detectados pelos satélites e permitir a chegada do socorro.
O EPIRB do “Mar Sem Fim” não foi usado. Não houve necessidade. O naufrágio aconteceu próximo da costa, em frente da Estação Antártica do Chile, onde a tripulação encontrou abrigo depois de abandonar o barco.
Um ano depois da tragédia, o “Mar Sem Fim” foi retirado do fundo do mar numa operação delicada e complexa, coroada de sucesso.
A vida nem sempre corre como o salvamento do “Mar Sem Fim”. Quando menos se espera, as coisas dão errado, não porque devam dar errado, mas apenas porque dão, sem que ninguém possa fazer nada para modificar o ritmo dos acontecimentos.
O sol brilha de um jeito para você e de outro para mim. Os dias não são iguais, nem belos na mesma sequência para todos. Da mesma forma que o EPIRB foi retirado do fundo do mar e se encontra na estante da minha sala, num gesto de amizade espontâneo e inesperado, os encontros e desencontros acontecem sem combinação ou expectativas. É assim porque é assim, para o bem ou para o mal. Uma mão estendida, ou um olhar, muda tudo e vice-versa. Bem aventurados os que a sorte protege, é deles a felicidade do mundo.