O jegue
O jegue é espécie em extinção. Até no nordeste, onde durante séculos ele era figura carimbada, carregando cargas de todos os tipos por enormes distâncias. Através de trilhas na caatinga, estradas de rodagem e ruas nas cidades, os jegues levavam o progresso na forma de mercadorias, bens e gente em seus dois jacás solidamente amarrados na cangalha, brutamente colocada em seu dorso.
Hoje, o que se vê são bicicletas, motocicletas, scooters, automóveis, peruas, vans, minivans, ônibus e caminhões de todos os tamanhos, financiados em 60 meses, dando alegria ao povo que, motorizado, se sente mais próximo do paraíso, ou dos milagres do Padre Cícero.
Assim, o jegue é raça em extinção. É uma pena, mas não tem jeito, contra a marcha do mundo não há o que fazer. Cada vez mais, menos jegues servem ao povo, carregando cargas maiores que seu peso, por centenas de léguas, com a paciência infinita dos muares que sabem que todo caminho tem um fim.
O jegue é forte e teimoso. Há quem diga que a ordem faz diferença e que, no caso, é o contrário. O jegue é teimoso e forte, por isso, pequeno, cor de burro quando foge, com pouco charme, exceto para os moradores da cidade que acham exótico aquele bichinho com uma cangalha nas costas e dois jacás carregados, durante 450 anos foi o mais eficiente meio de transporte de uma vasta região brasileira.
O jegue é teimoso. Se fosse menos teimoso, largava a carga no meio do caminho, deitava, fingia que estava sem fôlego e deixava os humanos se danarem. Mas não, como é teimoso e brioso, ele segue em frente, até cair exausto, fingindo que está tudo bem. Jegue que é jegue não cede, não desiste, não entrega os pontos. Afinal, ele é um jegue.