Perdidos nas lembranças
Rostos e nomes vão ficando para trás, escondidos na poeira do caminho. Inexorável, a vida segue em frente e o passado vai passando, lentamente, feito garoa caindo em tarde de inverno.
O que era fundamental ontem, hoje, não é mais que um vago sinal, uma mancha de mofo na parede da memória, e, às vezes, uma doce nostalgia, que extravasa da alma no esboço de um sorriso.
Sei de tanta coisa que já esqueci. A rotina cruel do tempo passando não perdoa. Sei, mas não me lembro. Apenas isso.
E quando faço um esforço extraordinário, vem uma imagem embaçada, ou a imagem de alguém que se eu encontrasse na rua, simplesmente não reconheceria.
A passagem do tempo é o bálsamo para a dor. Apaga o sofrimento, esconde na névoa de nosso universo os buracos negros que nos machucaram, as traições, os gestos baixos, a vergonha do erro.
Mas, de repente, um cheiro na rua, uma pessoa virando a cabeça, uma cor, ou um objeto, abre a comporta dos dias passados e a recordação escondida ressuscita. Chega violentamente, sem aviso, forte como se fosse o presente.
E com ela vem a vontade de rir e de chorar. De pegar o fantasma e abraçá-lo, abraçá-lo ternamente, como se fosse a criança que há em nós e que é preciso não deixar morrer.
Ah, os fantasmas que não nos assombram, mas que trazem na sua saudade momentos únicos de rara felicidade.
Como eles chegam, partem. Retornam para o limbo do semiesquecimento que a velocidade da vida os condena. Ainda bem que de tempos em tempos, sem aviso, eles fogem.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.