O poeta de Sergipe
A primeira emoção que eu tive em Sergipe foi conhecer Aracaju no ano de 1972, num verão onde a vida corria mais mansa e ser feliz ainda parecia fácil. A descoberta da pequena cidade, clara e limpa sob a luz do sol equatorial, foi um impacto bom e profundo, que dura até hoje, nas lembranças gostosas de uma cidade amiga e tranquila, aonde eu fui feliz.
A segunda foi conhecer a poesia de um homem extraordinário, trazido, um belo dia, sem aviso pelo poeta Paulo Bomfim, que me abriu os caminhos e meandros dos versos de Santo Souza.
– Poeta de Sergipe, pena que o Brasil é uma nação de analfabetos, onde gente do seu talento é manjar em banquete de poucos talheres, em vez de estar no currículo obrigatório de todas as escolas.
Santo Souza vai além do óbvio, do esperado, do bonitinho da poesia sem talento que enche as tardes das televisões e as páginas das revistas de variedade.
No verso de Santo Souza gira um universo denso que cria deuses e mata ilusões, no ritmo da expansão do cosmos, ou da batida do coração. Ler Santo Souza é entrar de cabeça nos mistérios da criação do mundo, entender o milagre do Big Bang e a presença de Deus por trás do milagre.
Nos versos do poeta a experiência da vida extrapola as fronteiras humanas, deixa Aracaju e São Paulo, ou Paris e Pequim, para se fundir no tempo e recriar os grandes momentos da aventura da Terra. O meteoro que destruiu os dinossauros, o dilúvio e a arca, o brilho dos olhos de Michelangelo dando vida ao Davi.
Seu ritmo quente e constante traz o bramido do mar quebrando nas praias o desespero da solidão dos náufragos, mas é também a liberdade do alto voo dos pássaros.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.