O dinossauro e o balé
O bailado segue pelo céu como se um enorme palco fosse montado só para mostrar a graça e a poesia do voo das grandes aves. Para cá e, depois, lentamente para lá, subindo e descendo ao sabor das correntes aéreas que mudam o rumo das aves caprichosamente, fazendo com que imitem a coreografia do voo dos anjos, quando voam na frente anunciando a chegada de Deus.
Se de perto os urubus são aves feias, com pescoço pelado, voando são a própria ideia da beleza, no desenho perfeito da cruz formada pelas grandes asas e pelo corpo. Na leveza cruzando o céu despreocupadamente, quase que brincando, certos de que a cidade foi feita apenas para preencher suas necessidades de básicas de comida e paz, sem inimigos próximos dispostos a lhes dar cabo do couro.
E eles voam encantando quem tem tempo para vê-los, cruzando a ponte da marginal lentamente para não perder o espetáculo.
Mas de repente, sem aviso, um personagem novo surge e ameaça a cena. Como ave de rapina, inesperadamente, um helicóptero cruza a dança das aves, espanta os urubus, rugindo pelo céu com seu corpo de dinossauro pré-diluviano, se impondo como um enorme monstro saído da mitologia e decidido a tomar conta do céu da cidade, num desafio claro ao herói que não está de plantão.
A diferença dos voos é gritante. De um lado a leveza estrema da natureza ocupando seus espaços. De outro a mágica do homem se impondo ao mundo, carregado por um dragão de metal, fabricado por ele a imagem e semelhança de um pesadelo, soltando mais fogo que os dragões dos contos de fada. De um lado a natureza dos urubus. Do outro o desafio do ser humano.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.