A mulher nua
No Largo do Arouche, bem de frente da Academia Paulista de Letras, tem uma estátua de uma mulher nua deitada com os braços numa posição de diva do cinema antigo. Em frente dela estão os bustos de alguns acadêmicos de destaque. Confesso que quando eu morrer também quero ter este privilégio, só que virado ao contrário, para ficar eternamente olhando para uma mulher nua deitada numa pose sensual.
Imagine as alternativas. Ficar eternamente deitado dentro de um caixão, no escuro, sem muito espaço para se mexer, ou, depois de algum tempo, ter o busto inaugurado próximo da linda estátua de uma mulher nua deitada, olhando pra você, enquanto você olha pra ela de volta.
Os dois tendo a eternidade para brincar, namorar, contar estórias, lembrar a história, falar mal do próximo, ou simplesmente ficar em silêncio, um olhando o outro, ela sempre sensual, nua e eternamente preservada em suas formas de mulher feita, vivida, conhecedora das coisas do mundo, do belo e do feio – que, por ela, me compete embelezar de novo.
A mulher nua do Largo do Arouche é um desafio à sabedoria acadêmica, à vontade de conhecer tudo que há nos livros. Ela, nua, deitada languidamente é a vida real se contrapondo à teoria, dando asas à poesia que voa alta embalada pela beleza deslumbrante das formas do corpo de uma mulher nua.
Nada no mundo é mais bonito do que o corpo da mulher. De qualquer mulher, de qualquer idade. Nele a vida se refaz permanentemente, recriando o sonho de felicidade do homem e o mistério da maternidade diariamente renovado nos segredos escapando do corpo, que o escultor da mulher nua do Largo do Arouche soube captar com a sensibilidade dos artistas, quando falam com os anjos.
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