Ser mãe
Ser mãe é ser campo e aceitar o arado abrindo a carne. Ser mãe é receber a semente. E ser cofre para guardá-la e esperar o tempo de vê-la germinar, e crescer, até explodir no mistério da vida e da perpetuação da espécie.
Ser mãe é ser pomar e ser horta. Ser fonte. Ser rio e oceano. Ser mata. Viver na carne os mistérios das grotas escuras das matas fechadas.
E sentir o machado e o fogo. Sangrar nas trilhas abertas e guardar os rumos que levam aos Eldorados das lembranças atávicas.
Ser mãe é acreditar nos sonhos e abrir caminhos para os que vêm depois. É ser estrada larga para os horizontes da vida e caminho secreto para os momentos das retiradas.
Ser mãe é sorrir do dia. E sorrir na noite. Sentir toda a carga de amor que se abate sobre ela, e que exige dela mais que o amor humano pode dar.
Ser mãe é sentir a carne cortada por navalhas afiadas. Ver o futuro com a transparência das pitonisas. Saber o momento de parar. Avisar. E não poder fazer nada para evitar as guerras perdidas e os tombos durante a jornada.
Ser mãe é saber do bom e do ruim. Ter na pele as marcas dos verões e dos invernos. E nos olhos a eterna ternura das tardes amenas dos dias de primavera.
Ser mãe é tudo isso e muito mais. É aceitar os mistérios da vida. Saber que é parte deles e que sem seu ventre a vida seria apenas uma esperança, morta logo depois de uma enorme explosão que se extinguiria sem deixar qualquer marca ou ao menos uma vaga lembrança. Ser mãe é saber que sem ela nem mesmo Deus existiria.
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