O carroceiro
Quando eu era menino, na fazenda da família, tinha permanentemente pelo menos duas carroças para fazer o serviço de transporte de carga, que variava desde lenha cortada, até os sacos de café colhidos no alto do morro e trazidos para secar no terreiro de tijolos, na frente da casa do administrador.
Uma era grande, armada com duas parelhas de burros, enquanto a outra era menor, com apenas dois burros para puxa-la pelas ladeiras íngremes da região de Louveira.
Eu gostava de pegar carona nelas, sentado perto do varal, com as pernas para fora balançando um pouco à frente da grande roda de madeira e vendo o carroceiro tocar seus burros, falando com eles uma linguagem toda especial, com palavras como “prrrr”, que os fazia parar, sem necessidade de puxar a corda presa nas cabeçadas.
Foi uma época boa da qual eu me lembro com carinho e saudade toda vez que sinto o cheiro de pão assando, quando passo perto de uma padaria.
E que vai arrumando outros jeitos de fazer eu me lembrar dela, por exemplo, quando recordo das carroças da fazenda, vendo outro tipo de carroceiros tocando suas carroças pelas ruas de São Paulo.
São bem menores, mesmo que a carroça pequena da minha infância, e, normalmente, tem um único cavalo, em vez de burro preso no varal. Mas, de qualquer jeito, são carroças e vê-las atravessar a cidade alucinada, além da forte dose de surrealismo implícita na aventura, me trazem também alguma coisa de carinho na forma como tento entende-las, e mais que elas, seus carroceiros, transportando toda sorte de coisa velhas, que são seu ganha-pão e sua valiosa fortuna.
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