Os dias frios
Pouca coisa é melhor do que dormir debaixo de cobertores bem quentes numa noite gelada. O problema é sair da cama na manhã seguinte. Mas, durante a noite, pouca coisa é mais gostosa e prazerosa do que, debaixo da coberta, sentir o frio rondando a cama, sem conseguir atingir-nos, brecado pelo cobertor quente, em cima dos lençóis macios.
Os dias frios me trazem sempre algumas lembranças muito fortes. Algumas da minha infância, outras da juventude. Dias frios me lembram café com leite de manhã cedo. Café com leite e pão com manteiga.
Quando eu era menino, era comum acordar antes das 6 horas, me vestir e descer para a colônia da fazenda, ainda no escuro, protegido do frio cortante pela calça rancheira e pela campeira xadrez.
Me lembro claramente da geada nos pastos, cobrindo tudo de branco e soltando fumaça, que, de verdade, era vapor. Eu descia pela trilha que cortava caminho pelo morro e entrava na estrada da colônia ouvindo a música caipira de raiz que saía dos rádios de válvula e se espalhava pela manhã começando, junto com as pessoas saindo de casa para iniciar mais um dia, no inverno, a maioria no cafezal.
Meu destino era a casa do Nego, o cocheiro dos cavalos. Meu café da manhã era com a família dele, em volta da mesa de madeira sólida, na sala ainda escura, mal iluminada por uma única lâmpada pendurada de um fio preso no teto.
Todos os dias sua mãe fazia pão italiano no forno do quintal. O leite, tirado na hora, era misturado ao café escuro, que caí do bico do bule na caneca de lata, enquanto passávamos manteiga no pão quentinho.
Poucas recordações são mais vivas do que essa. Mais vivas e mais ternas. O café da manhã nos dias de inverno na casa do Nego é o lado bom e claro da vida. Por isso o cheiro de café com leite mexe comigo.