O primeiro carro a gente não esquece
Meu primeiro carro foi um Opala Especial, 2500, verde amazonas, ano e modelo 1971. Tinha câmbio de três marchas na coluna da direção, freio a tambor nas quatro rodas e usava pneus de Dodge Dart para melhorar a estabilidade.
Além disso, tinha algo que só um outro carro no Brasil tinha, o Corcel do meu primo Mando: meu Opala tinha um toca-fitas de carretel, chamado
Joãozinho, com uma luz vermelha que dava um ar especial para a cabine do carro. Viajar para o Guarujá, descendo a Via Anchieta, trocando de lado a fita do toca-fitas, como se fazia com as fitas dos gravadores de rolo, podia ser emocionante e muita gente ficava com medo.
O Joãozinho foi construído pelo Mando usando o corpo de um gravador Phillips de carretel de cinco polegadas e o amplificador e a cabeça de um toca-fitas de cartucho Muntz. O som era estéreo.
Em dois anos de uso, meu Opala rodou mais de noventa mil quilômetros sem ter qualquer problema, além de furar pneu e acabar a bateria. E não é que as viagens se resumissem às boas estradas perto de São Paulo. Eu e meu amigo Zé Cássio fomos até o rio Grande do Norte, fazendo um trajeto nosso, que passou por Uberaba, Brasília, Belo Horizonte, cidades históricas mineiras, Governador Valadares, Teófilo Otoni, Feira de Santana, Salvador e o restante da BR116, até chegar em Natal. Foram mais de dez mil quilômetros, entre janeiro e fevereiro de 1972.
Meu Opala era sólido, espaçoso e embaçava os vidros quando chovia. Não tinha ar condicionado, direção hidráulica ou insufilm. Mas, com correntes nas rodas, passava pelas estradas de terra e lama de Parati, começando na serra de Cunha, com a sem cerimônia dos tratores de esteira. Meu primeiro carro foi um grande carro. Não sei se os carros de hoje aguentariam uma pequena parte do que ele aguentou.
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