A ciclofaixas lotadas
Se alguém tinha alguma dúvida sobre a vontade ou a necessidade das pessoas saírem de casa, foi só olhar as ciclofaixas depois que reabriram para o assunto ficar claro.
Os espaços estavam lotados de ciclistas, com e sem máscaras. Todos pedalando a necessidade de mostrar que estavam vivos, que a pandemia está aí, mas quem liga?
Leia também: O ônibus e as bicicletas
A hora é de entrar de cabeça na vida, mesmo que isso signifique correr o risco de morrer, porque o vírus não foi embora, segue firme e forte, esperando para fazer a próxima vítima.
São mais de mil, todos os dias, Brasil a fora. E não tem nada que indique que o número vá cair. Aliás, não tem razão para cair. É lembrar como as ciclofaixas estavam para se ter certeza disso.
Como uma manada de gnus atravessando os rios da África, parte dos ciclistas pedalava como se não tivesse outro jeito, como se fosse sua missão atravessar a cidade, desesperadamente, alucinadamente, desde que chegasse em algum lugar ainda não sabido, mas onde estaria o mapa para a felicidade.
Não sei quantas pessoas saíram para aproveitar a reabertura das ciclofaixas e pedalar por São Paulo, mas foram muitas. Com certeza, entre todas as ciclofaixas da cidade, alguns milhares.
Depois de meses confinados, os paulistanos têm a necessidade de sair, nem que seja para ver o céu, descobrir os horizontes curtos que as janelas dos prédios impedem de serem vistos.
Leia também: Nem sempre é correto
Pedalar no domingo tem algo de mágico, atávico, desesperado. Algo de missão, de que precisa ser feito. Tanto faz se no final não tem final, como os salmões que sobem os rios para desovar exatamente no local onde nasceram. Pedalar é mostrar que se está vivo, que ainda não foi desta vez.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.