Os pássaros sem vergonha
Não há dúvida nenhuma, os pássaros que moram em São Paulo são muito sem vergonhas. É ver a tranquilidade com que voam e pousam nos lugares mais inusitados, sem medo nenhum de qualquer um de nós, para se ter certeza disso.
Seja uma rolinha, seja um bem-te-vi, ou um sabiá laranjeira, nenhum mostra o mais remoto receio, da mesma forma que os beija-flores ou os pequenos passarinhos que eu não sei o nome, e que, por isso mesmo, o Zé Santinho chamaria de passarinhos bobos do brejo.
Zé Santinho foi quem me fez gostar de mato, de caçar, ainda que não matando nada, só pelo prazer de ficar sentado, escondido, dentro de uma mata fechada, vendo a vida se desenrolar em volta, nas aves, nos macacos e até em animais maiores, como pacas, tatus e veados.
São Paulo hoje tem mais aves do que os campos em volta. É lógico ser assim. Afinal a vida aqui é muito mais fácil para elas do que na natureza de onde vieram e para onde não querem voltar.
Voltar pra que, se lá a vida é dura e paga pesado, na necessidade constante de procurar comida e fugir dos predadores?
Na cidade o lixo é farto e fácil de virar comida. Basta algumas bicadas num saco plástico e pronto, um banquete aparece na frente do gavião pinhé que já não gosta mais de caçar bem-te-vis.
E os sabiás são mais abusados ainda, atacando as tigelas com ração de cachorro, ainda que correndo o risco do cachorro ser meio alucinado e, com uma única mordida, pegá-los em pleno voo.
É a adrenalina que eles precisam para começarem a cantar de madrugada, ainda escuro, atrás das fêmeas que são a grande recompensa desta vida relativamente mansa e com certeza melhor que nos campos.
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