Certas manhãs
Algumas manhãs são tão lindas que mudam o rumo do dia. Mesmo numa cidade como São Paulo, certas manhãs deixam pra trás a rotina seca e cinza de só mais um dia, para explodirem, cheias de cor, de vida, limpas e transparentes como deviam ser as manhãs do começo do mundo.
Nelas as flores das paineiras e de algumas outras árvores que eu não sei o nome, acompanham a viagem cidade à dentro, balançando nos galhos coloridos a esperança que permeia o dia com algo belo e puro, que faz mais alegre os olhos e mais imprevisível a vida.
O céu tem um azul transparente que se estende profundo, até o infinito, dando aos homens a perspectiva do campo dos anjos.
São manhãs tão especiais que nelas até o trânsito parado por conta de alguém na pista da esquerda querendo entrar à direita para acessar a marginal, pega leve, como a brisa gostosa que balança as flores das paineiras ao lado da ponte, não para derrubá-las, mas as embalando, as ensinando a dançar, em homenagem ao dia único que nasce atrás dos prédios do outro lado do rio, puxado pra cima pelo sol saindo do escuro da noite.
Nessas manhãs a alma se descobre leve, sem culpas, de bem com a vida e pronta para aceitar o milagre do mundo, reconhecendo nele o presente que Deus deu a si mesmo para espantar de seus dias a solidão da eternidade.
O rio correndo embaixo da ponte é uma enorme estrada em direção ao sonho, aos eldorados a serem descobertos, às lendas dos índios, à esperança dos brancos, aos Sabarabuçus, às minas de prata, à liberdade da viagem pelos Peabirús da imaginação.
Certas manhãs sem nenhuma razão maior dão sentido à vida.
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