As rodoviárias
Promessa e castigo. Sonho e desilusão. Vida, acima de tudo vida, correndo, na chegada ou na partida de um ônibus para qualquer destino. A nós, que importa o roteiro, se não estamos nele, nem viemos, nem vamos, agora ou depois. Mas quanto de poesia tem na plataforma escura aonde chegam ou partem os que deixam suas vidas num banco de ônibus, acreditando que o amanhã será de luz, ou desiludidos com a dureza de ontem.
De longe, iluminadas, depois da longa viagem vindo de algum fim de mundo esquecido por Deus, a entrada na cidade grande é a saudação dos anjos, prometendo o paraíso, nas luzes que brilham como pedras preciosas, mostrando as riquezas sonhadas nas noites de miséria, no lugar distante onde a chuva não cai, ou onde a vida é dura e perversa, onde os filhos morrem de fome ou doença, nos braços tristes das mães.
A cidade é o Eldorado mágico onde Deus escondeu as bênçãos do mundo e a Rodoviária o portão por onde os eleitos entram nos campos Elíseos, para, com seu trabalho e seu suor, arrancar novos tesouros das profundezas da terra. Para fazer a vida e, depois, voltarem, ricos, recompensados de tanto sofrimento e tanta saudade, mas sempre tendo a certeza de que o lugar de origem será o porto amigo no final da viagem, o chão que receberá alegre o filho que foi pra longe, buscar uma vida melhor para ele e os seus.
Quanto de sonho a cidade grande arranca do peito e quanto de dor as plataformas da Rodoviária já viram manchar seu cimento, na lágrima que cai e se funde ao chão, aumentando as histórias de partidas e despedidas sem saudade, de gente que veio, viu e perdeu. De gente que veio para encontrar a realidade brutal de uma vida que não era a sua.
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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.