Debaixo das pontes
Debaixo das pontes deveriam passar carros, caminhões, água, esgoto, enxurrada, coisas assim. Deveriam e passam. As pontes de São Paulo não são uma exceção. São pontes como qualquer outra do mundo, ou pelo menos como as pontes mais civilizadas, com comportamento clássico padrão.
Mas as pontes de São Paulo têm uma particularidade que é tipicamente delas e que as faz ter outra utilidade, normalmente não incluída nos serviços normais, esperados das pontes.
As pontes de São Paulo servem de moradia. São costumeiramente usadas como residência, em alguns casos até com endereço fixo e definitivo, quem sabe até sujeitas ao usucapião, pelo tempo que algumas famílias ocupam suas entranhas.
Morar nas entranhas de uma ponte pode ser interessante, confortável e muito barato. Afinal, sua estrutura é enorme e oca, o que dá um imenso apartamento, com a possibilidade de vários cômodos e um certo espaço extra, melhorado por uma gambiarra para puxar luz elétrica.
Várias pontes têm gente morando dentro ou debaixo delas – em favelas bem protegidas – faz muito tempo e não há nada que indique que pretendam sair de onde estão.
Mas hoje o tema não é o morador permanente. O tema é as pontes normalmente desabitadas que nas noites frias têm suas calçadas ocupadas pelos moradores de rua.
É triste e é deprimente. Ver aquelas pessoas amontoadas como bichos, cobertas por trapos e pedaços de papel e papelão, é o melhor remédio para parar de achar que a vida é dura conosco. E faz pensar seriamente o que fez esse país dar tão errado.
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