As palmeiras também traem
[Crônica de 26 de junho de 1998]
Pode parecer incrível, mas a palmeira onde meu sabiá de estimação canta e come coquinhos não é uma palmeira brasileira, é uma palmeira australiana.
Aliás, não é a minha palmeira que não é brasileira, pelo que aprendi, a maioria das palmeiras de São Paulo, ou pelo menos boa parte delas, é australiana e foi espalhada pelos sabiás, que, mesmo sendo brasileiros, parecem preferir os coquinhos das palmeiras australianas.
Até aí nada demais, apesar de, à primeira vista, poder ser considerado politicamente incorreto.
Afinal, os sabiás que cantam nas palmeiras de minha terra deveriam preferir os coquinhos das palmeiras autóctones aos coquinhos das palmeiras arrivistas, entradas em chão brasileiro sabe deus de que forma.
Mas – existe sempre um, mas – a verdade é que os sabiás, por razões que eu desconheço, por não ser especialista em coquinhos, preferem as frutas das palmeiras australianas, e fazem uma festa na frente da janela do meu escritório quando os coquinhos vermelhos ficam maduros.
Diga-se de passagem, os coquinhos vindos da Austrália devem ser muito bons. Se não fossem, não teria porquê os periquitos, que voam em bandos pela cidade, expulsarem os sabiás das palmeiras, para comerem os coquinhos.
As palmeiras australianas são lindas. não deixam de ter um certo ar nostálgico, com seu tronco nem grosso, nem fino, encimado por uma copa de folhas grandes, que caem molemente, como se estivessem com preguiça, formando um arco elegante, em direção ao solo.
Fruto da andança das plantas pelo mundo, o professor Paulo Nogueira só me contou que elas chegaram ao Brasil e que, com a ajuda dos sabiás, tomaram São Paulo de assalto, como tantas outras plantas que, de tão comuns, a gente até pensa que são brasileiras.
Quem diria, mas as bananas não são brasileiras, como não é brasileiro o coco da Bahia, ou a cana caiana, e o limão galego.
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