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Os Sabiás boêmicos

Os sabiás voltaram a cantar de noite. Três horas da manhã, lá estão eles, dentro da madrugada, soltando a voz, ou o pio, com a clara motivação de arrumarem uma fêmea e acasalarem para manter a espécie. 

Manter a espécie é uma explicação interessante, mas não há como contradizê-la, até porque a única forma de manter a espécie é essa. Ainda não inventaram um jeito diferente de um óvulo e um espermatozoide se unirem para gerar a vida de uma série de animais, incluídos humanos e não humanos no imenso rol desenvolvido pela natureza.

Tem quem goste da cantoria dos sabiás, tem quem não goste e tem quem chega a ficar com raiva das aves porque, graças a elas, não conseguem dormir direito. 

Eu gosto dos sabiás cantando de madrugada, tem poesia e emoção na cantoria. É a vida acontecendo em toda sua força e é bonito ver a vida acontecer, ainda mais na sua força máxima. Sua força criadora, sua capacidade de se preservar e evoluir na longa estrada iniciada milhões de anos atrás e sem fim previsível, dentro da sua precariedade.

Os sabiás são, antes de tudo, boêmios. A cantoria tem como gancho as luzes da cidade que lhes permite soltar a voz quando deveria estar escuro, mas, graças à iluminação pública, está claro. Malandragem de gente da noite, de gente que sabe que viver é mais do que respirar e comer. 

Cantando de madrugada eles abrem vantagem sobre as aves que gostam de dormir. E fica mais fácil se acertar com a fêmea que fica acordada, adorando a cantoria para ela.

Mas, de repente, assim que amanhece, os sabiás se calam. É que, cansados dos trabalhos noturnos, vão dormir algumas horas antes de iniciarem a jornada diária. Daí pra frente, o canto é menos desesperado. 

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.