Não tem jeito, vai ter barulho
A vida moderna, na cidade grande, tem um capítulo que se repete em qualquer lugar do mundo. O barulho, o barulho é uma constante 24 horas por dia em qualquer cidade grande, de Bombaim a Tegucigalpa, de São Paulo a Riad, tanto faz, o barulho é marca registrada em todas elas.
Está presente em todas elas. O barulho é criativo e pródigo em inventar novas formas de se perpetuar, de causar mal-estar de agir subliminarmente, enganando as sensações humanas.
De outro lado, o ser humano é hábil em driblar as dificuldades, enganar quem quer lhe enganar, ele encontra novas formas de se adaptar, de fazer de conta que não é tanto assim, que com um pouco de jeito está tudo bem.
Muito anos atrás fiz uma experiência que eu recomendo que você faça. Coloquei um gravador ligado na janela e deixei gravando os barulhos da cidade para ver o que acontecia. A primeira constatação foi que a cidade tem um ronco contínuo, que não para 24 horas por dia, 7 dias por semana, 365 dias por ano.
Tanto faz chuva ou sol, tanto faz a hora do dia ou da noite, o ronco está lá imutável, não aumenta nem diminui, apenas recebe a ajuda de outros barulhos específicos, uma sirene de ambulância, o escapamento aberto da motinho 125 fingindo que é muito mais poderosa, a acelerada do caminhão na subida, o jato que pousa, um atrás do outro, em intervalos de poucos minutos.
A cidade é barulhenta, até quando parece adormecida, como num domingo de manhã, o barulho segue firme, no ronco contínuo, no tiro, no estouro do escapamento, na brecada, na pancada da trombada.
Não tem o que fazer, o interessante é que a gente se acostuma.
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