Contrastes
[Crônica de 16 de novembro de 2000]
A Avenida Dr. Arnaldo é uma avenida muito curiosa. De um lado fica o cemitério do Araçá e, do outro, a Faculdade de Medicina, é um contraste impressionante e, no mínimo curioso.
Em frente ao templo da vida, a escola encarregada de formar os homens que devem prolongar nossos sonhos de imortalidade o monumento máximo à transitoriedade humana, à nossa insignificância e à nossa necessidade de preservar a lembrança de um passado que é nosso e que se perde na noite do tempo.
De um lado a tristeza e de outro a alegria da vida, contraditórias, mas parte de um mesmo todo, composto pelos bilhões de seres humanos que correm de um lado para o outro, poluindo o planeta, atrás do sonho da vida eterna, tão bem caracterizado pelos dois lados da avenida, pelo cemitério e pela escola de medicina, onde a pesquisa é o contraponto da lembrança eternamente adormecida debaixo das imagens frias que perpetuam os nomes das famílias e de cada um de seus membros.
Na faculdade sóbria a pesquisa científica, levando em conta a matéria de que é feito o ser humano, suas deficiências e pontos fortes, suas necessidades, seus mistérios físicos e psíquicos, atuando como mola na busca da materialização da esperança de se tornar outra vez a imagem e semelhança do Senhor, no retorno ao paraíso perdido nesse vale de lágrimas mesmo.
Atrás dos muros cinzas e das bancas de flores que com suas cores amenizam a ideia da morte, o cemitério. Túmulos e túmulos, um ao lado do outro, como uma imensa cidade em miniatura, com ruas e esquinas e cruzamentos perigosos e ladrões que invadem as casas, violam a privacidade dos moradores, e os ameaçam constantemente, protegidos pela certeza do seu silêncio.
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