A torre da igreja nas manhãs de sol

[Crônica de 11 de junho de 2009]

A torre da igreja é feia. Delgada, alta, fora da medida do resto do conjunto, ela surge iluminada de roxo nas noites do ano inteiro, ou sem graça, na maioria das manhãs.

Vista pelos fundos, por quem vem pela Rua Lisboa, a torre da Igreja do Calvário é rotina, e chama pouca atenção, erguida ao lado do prédio do Instituto Goethe, saindo do meio de um pequeno bosque, provavelmente um antigo pomar plantado no quintal do fundo da igreja.

 Mas tem dias que a torre muda de jeito. É como se a magia do mundo unisse forças e escolhesse estas manhãs para brincar na terra, tomando paisagens inexpressivas e transformando-as em cenários de luxo, de beleza e poesia.

Bruxas e fadas somam seus poderes e encantam a vida, criando outro universo, paralelo, em cima do dia a dia de cada um de nós.

Tomam uma torre de igreja de bairro, sem medida ou proporção e a transformam num minarete de conto de fadas, de viagem de Simbad. Depois a fazem reluzir, valorizando a luminosidade do dia, ímpar dentro daquela única manhã.

Abrem uma nova luz, arrancada do sol, transformado em estrela de terceira grandeza, e radiante por brilhar mais. Misturam-na com o azul de um céu profundamente calmo e limpo, e colocam a torre da igreja deliberadamente no meio. Bem em frente de quem vem de carro pela Rua Lisboa para entrar na Avenida Sumaré.

Não tem como não sorrir. Achar o mundo belo e a vida mais bela ainda, composta de horizontes de sonho, criados por fadas brincando com bruxas. Estes dias não acontecem sempre. Tem data e hora marcadas na agenda das bruxas. Muito além da vontade dos mortais.
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