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A volta das que já tinham ido

[Crônica de 7 de setembro de 1998]

Pode parecer incrível, mas quando tudo levava a crer que a florada das azaleias era passado, estando a próxima prevista apenas para o inverno do ano que vem, eis que as azaleias do Pacaembu e de Higienópolis decidiram que era hora de explodir suas cores, modificando completamente a cara da cidade.

Poucas azaleias, este ano, floriram como elas. As árvores estão cobertas de flores, numa orgia capaz de desviar os olhos menos atentos, atraídos pelo inusitado da sua explosão.

Os dois bairros estão em festa, coloridos pelas flores que se espalham pelas ruas, praças e jardins, sem ordem de grandeza, todas abertas e expondo o milagre de seus roxos, vermelhos e brancos, numa sequência quase melódica onde a composição ultrarrealista se impõe com a força da vida multiplicada por sua necessidade de perpetuação, estampada nas pétalas abertas.

Até as pequenas azaleias da frente de meu escritório se abriram juntamente com suas irmãs, carregadas de flores vindas eu não sei de onde, ou escondidas eu não sei onde, enfeitando o muro onde estão plantadas com a alegria sem razão de suas cores deslumbrantes.

E se as minhas mirradas plantinhas estão belas, imaginem as grandes e elaboradas azaleias dos jardins maiores e mais antigos. Estas são quadros vivos, reproduzindo a beleza natural que nenhum quadro consegue transmitir.

O resultado é que até o trânsito parece que melhorou.

Os carros passam como se estivessem de bem com um com os outros. Seus semelhantes são apenas semelhantes e não inimigos que precisam ser destruídos, porque um é mais macho do que o outro.

É isso que é fascinante e incompreensível. Enquanto o homem se mata das formas mais estúpidas possíveis, as azaleias, de graça, dão lições de vida.
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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.