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As floradas passam e a vida também

A florada dos ipês brancos é rápida. Esta crônica vai ao ar com ela já passado, as árvores não estão mais floridas. Seus galhos ostentam apenas as folhas meio secas e sujas, depois de enfeitarem a rua com a força maravilhosa de seu branco contrastando com o azul do céu.

Agora, os ipês amarelos seguem em frente. Mas mesmo eles já estão perdendo suas flores. Muitos já floriram, outros seguem sua sina, com as flores enfeitando seus galhos e puxando a memória para outro tempo, quando a vila encravada do outro lado da serra ficava praticamente vazia, com os homens no sertão e as mulheres cuidando das fazendas em volta, onde a vida corria enquanto as casas da cidade permaneciam vazias.

A demora podia ser de meses ou anos. Algumas de vários anos. Tanto faz, a vida seguia seu rumo, sob o comando firme das matronas, a maioria mameluca, que tomavam conta das fazendas com competência para fazer vinho,  cuidar dos pomares e dos campos de trigo.

A vida não foi feita para ser fácil, foi feita para ser vida. Esse era o mote que balizava os habitantes do planalto. Povo meio bárbaro, que fechava a entrada da vila quando não queria receber os visitantes. Algumas vezes, padres inquisidores, que não entravam em São Paulo porque aqui não se exercia tão torpe ofício.

As floradas podem lembrar outras cenas, outras épocas, um tempo em que não era nada do que é hoje, quando a vida pegava pesado, mas um pesado diferente, mais próximo da natureza, menos envenenado pelos gases que soltamos na atmosfera e que ameaçam a vida humana com choques de calor e frio, chuva e seca, se seguindo indiferentes.

As floradas passam. A vida também passa. É assim porque é assim. Não tem remédio, não tem volta, não tem remissão. Cada minuto vivido é um minuto a menos na linha da nossa vida.     

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.