A força do inhame
[Crônica de 20 de outubro de 1999]
Desde que eu me mudei para meu escritório, há coisa de mais de dez anos, seu quintal sempre teve encostado no muro do fundo, um renque de inhames.
Aliás, este renque é muito mais velho, porque quando me mudei ele já existia, tendo sido plantado bem antes, provavelmente por minha tia que era a dona da casa.
Neste período o escritório passou por uma reforma que se estendeu por mais de dois anos e meio, não por ser enorme, mas por conta da incompetência dos empreiteiros que tocaram as obras.
Mesmo com seu canteiro quase todo coberto por cimento e pedras, sem qualquer tipo de trato, com algumas plantas arrancadas pelos pedreiros, os inhames resistiram e sobreviveram, e suas folhas ressurgiram no meio do entulho tão logo acabou a reforma.
Isto já faz três anos e meio e daí para frente os inhames, bem tratados, com o entulho retirado, com a terra revolvida, regados e com direito a sol, acabaram retomando seu espaço, fortes e saudáveis, encostados no muro do fundo, onde reinam absolutos pelo menos há 20 anos.
Só que, de repente, de uns tempos para cá, comecei a estranhar que o seu número, mesmo estando bem tratados e provavelmente felizes, diminuía.
Como não me pareceu lógico os inhames estarem migrando para outro lugar, em busca de melhores condições de vida, a resposta para seu sumiço tinha que ser outra.
O problema era saber qual? O que poderia estar atacando e sumindo com os inhames do meu quintal?
Pensei primeiro no chupa cabras. Talvez estivesse roubando os inhames para comer junto com o sangue de suas vítimas. Quem sabe cientistas alienígenas, quem sabe um monte de quem sabes. Eu não tinha a resposta. Até que ela surgiu clara: quem estava comendo os inhames era a faxineira do escritório que é louca pela raiz.
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