São Paulo não é completamente cinza
[Crônica de 11 de dezembro de 2013]
Ainda que com gente fazendo força para ser, São Paulo não é completamente cinza. Não está nem perto disso, com verde de todos os tipos brigando feito gente grande para manter seu espaço e, se der, conseguir um pouco mais.
Tem flor em cima da geladeira, tem flor de plástico em cima da geladeira, tem flor de verdade murchando em cima da geladeira, tem um vaso em cima da mesa, tem flores coloridas colorindo a vida das pessoas dentro da casa, na frente da geladeira.
Tanto faz, do lado de fora o pôr do sol espera a hora certa para enfeitar o céu com o vermelho mais denso e o laranja mais transparente. Tem azul num resto de fundo, não coberto pelas nuvens, e tem nuvens brancas escondendo o cinza criado pelo progresso.
E tem as cores do progresso, as casas pintadas, os prédios pintados, o sonho que faz de conta que acontece, mas volta pra dentro, e se esconde atrás do pote de ouro no fim do arco-íris.
Cada movimento é único e não se repete. Nem mesmo o bate estaca bate duas estacas da mesma forma. Aqui o terreno é mais duro, ali a estaca está mais torta. Mais na frente, o lençol freático, mal-humorado com a bateção ao lado, simplesmente cede, deixando um buraco debaixo da estaca.
Os buracos são os donos da rua. Costumam ser cinza e adoram engolir o entorno para deixar mais cinza o cinza da sua tristeza. Buraco que se preza é triste. Por isso são maus. A explicação não cola. Buraco não é bom nem mau, buraco é apenas um buraco.
A falta de alguma coisa que as plantas espalhadas pela cidade insistem em descobrir para colorir com todas as cores de suas flores se abrindo a cada momento, como se a passagem do dia fosse uma valsa.
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