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Eles param pra ver!

[Crônica de 16 de janeiro de 2001]

Os acidentes em São Paulo são responsáveis por uma quota enorme do número de mortos que permanentemente enluta a cidade. Acidentes de todos os tipos, desde armas que disparam sem querer, até afogamentos em represas poluídas onde é proibido nadar, passando pelas quedas que entopem os prontos-socorros de ortopedia.

Mas, com certeza, nenhum tipo de acidente causa mais dano do que os acidentes de carro. Eles respondem por pelo menos metade do total de vítimas fatais que poderiam continuar vivas, mas que morrem, na maioria das vezes sem sequer saberem por quê?

É um quadro triste que faz o Brasil líder em mais uma estatística triste, dando destaque ao pouco amor que temos pela vida humana. Vida que não tem preço, mas que aqui chega a custar menos de dois reais, quando custa alguma coisa.

Nos acidentes mais sérios, além do custo do acidente em si, a cidade inteira ainda paga um outro custo, quase tão alto como os danos do próprio acidente. O congestionamento que se espalha por mais de cem quilômetros não tem preço, nem pode ser integralmente compensado, mesmo se o causador do acidente original se propusesse a indenizá-lo.

Só que este congestionamento, que, por causa do acidente, de qualquer forma seria enorme, fica maior ainda, graças a contribuição única e sem sentido de um terceiro que não tem nada com aquilo, mas que faz questão de contribuir para aumentar o caos: o curioso!

Nada é ou pode ser tão daninho como o curioso, o amante da desgraça alheia, o vampiro do sangue no asfalto, que entra em alfa toda vez que vê um acidente e por isso torce para ser o mais grave possível.

Ele faz questão de passar devagarzinho, bem devagarzinho, com meio corpo pra fora, para ver melhor.

E o resto do mundo que se estupore, porque o sangue e os outros detalhes macabros do acidente, estes, ninguém rouba dele.

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.