O voo do padre

[Crônica de 13 de maio de 2008]

Há poesia no voo solto de um balão perdido subindo ao céu. Na criança correndo atrás. Na sensação de perda, ou de encantamento. Na descoberta de que o balão vai alegrar as tardes dos anjos, jogado de nuvem para nuvem, até murchar e ser deixado de lado, descartado como os sonhos esquecidos anteontem.

Há poesia nas cores redondas, formando cachos, penduradas dos lustres nas festas das crianças. Mas há mais poesia nos olhos dos adultos brilhando como os olhos das crianças, se lembrando do tempo em que eram meninos e um balão, um único balão, especial, tinha que ser o seu.

E há poesia na loucura do padre que ordenou aos balões que o levassem pelos céus num protesto inusitado e na entrega absoluta aos desígnios de Deus. Mil balões são suficientes para erguer um homem, mas só a certeza de todas as possibilidades é capaz de levá-lo 500 quilômetros, se não for Maringá ou Londrina, para o mar.

Só a fé cega dá coragem. E a irresponsabilidade da certeza desata as amarras. O rumo é qualquer rumo, no voo sem controle, sem norte, sem sul. Sem leme. Como os primeiros homens desbravando a terra e abrindo as portas da conquista do planeta.

Astrolábios e bússolas são mera ilusão.

A marcação dos rumos se faz na vontade de virar poesia, no inusitado do voo, na insensatez da aventura, na forma dramática como o padre sumiu, para se abrigar no céu e brincar com os anjos, e contar estórias de aventuras para as crianças a quem Jesus prometeu as tardes da eternidade.

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