Chuvas

Até mesmo a maioria das vezes em que entramos na mata, sentindo na hora o cheiro bom de terra úmida, some, completamente esquecida entre lembranças mais importantes, que também somem, engolidas pelo dia a dia da vida e pela sequência impressionante de experiências que vamos vivendo e que vão enterrando as lembranças menores, como a maioria das chuvas e os pores do sol que nós não vimos, e as luas cheias que foram apenas luas cheias, cumprindo seu ciclo sem impacto e indiferentes à gente ou as nossas lembranças.

É assim com as estrelas e com os cometas que passam de século em século. E é assim com as flores que nós damos para a amada e que murcham e se tornam opressivas e por isso são jogadas fora. E esquecidas. Até darmos outras flores que confirmam nosso amor e fazem a amada se lembrar de outras flores que ela jogou fora, mas que lhe despertam um momento adormecido na memória, em que o cheiro bom de um jasmim florido lhe lembra uma noite de amor, sob uma lua cheia, depois de um pôr do sol especial.

Mas existem as chuvas que ficam, que se perpetuam como a vida que elas ajudam a criar e que vivem eternamente dentro da gente, como o cheiro do jasmim adormecido na memória da amada.

São chuvas que caíram há muito tempo, em outro lugar, em outra realidade, mas que, de repente, renascem do barulho da chuva caindo no telhado ou do cheiro da terra molhada, e nos remetem para outra vida, viva dentro da gente, tão intensa quanto o nosso bem querer e a vontade de amar a amada.

___
Siga nosso podcast para receber minhas crônicas diariamente. Disponível nas principais plataformas: Spotify, Google Podcast e outras.

Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.