O inverno legal

[Crônica de 26 de julho de 2004]

Alguns invernos são mais legais do que os outros. As razões para a diferença são as mais variadas e dependem do ponto de vista de quem acha. 

Alguns acham que o inverno é mais legal porque é um inverno sem frio, outros acham que o inverno é legal porque tem frio, outros porque não têm lareira, outros porque têm lareira etc.

Cada um tem seu motivo e não dá para dizer que ele não tem razão. Todos os motivos são válidos, ainda mais nas democracias modernas, onde o achismo segue razões que a própria razão desconhece.

Mas este ano especificamente o inverno tem sido um inverno legal, pelo menos para a população da cidade de São Paulo, que estava ameaçada de ter que aguentar um racionamento de água e agora, graças ao inverno chuvoso, está livre da ameaça, pelo menos até a primavera.

É uma notícia boa que me faz ter um carinho especial com esse inverno típico, que vai se tornado atípico, porque, ao contrário dos últimos anos, até frio tem feito, para alegria de quem tem lareira, de quem gosta de vinho e de quem vende lenha e vinhos.

O frio tem vindo duro e úmido, da mesma forma que o frio do inverno de 1932, quando mais de 20 mil paulistas estavam nas trincheiras da revolução, mal armados e mal equipados, comendo o pão que o diabo amassou, sentindo a friagem subir pelas pernas, enquanto as granadas e os tiros estouravam em volta.

A diferença é que agora não estamos em guerra. Nossa democracia não parece ameaçada e o país tem outra cara, muito mais moderna e próxima dos ideais paulistas do que da visão da ditadura. Como se não bastasse, chove e a chuva enche as represas.