O asfalto e o buraco
Ninguém pretende criar uma guerra. Afinal, o tema é mais velho do que Matusalém ou da idade da Vila de Piratininga, coisa de mais de 460 anos.
Os buracos são parte constante da paisagem paulistana. Ainda no século 16, o Conselho da Vila determinou mais de uma vez a reforma da tranqueira que servia de muralha, invariavelmente cheia de buracos por falta de manutenção. E ao longo da história, quantas e quantas vezes se determinou a reforma do Caminho do Mar e tantas outras picadas e estradas que, por falta de manutenção, cheias de buracos, quebravam os veículos que por acaso ousassem trafegar por elas?
Os paulistas preferiam as picadas na mata, pelas quais seguiam numa toada tipicamente indígena, na maior parte das vezes descalços, como descreve Sérgio Buarque de Holanda. Para eles era indiferente, pelo menos até certo ponto, se a picada estava ou não esburacada.
Seguindo a pé, os buracos comuns não atrapalhavam. Simplesmente desviavam e tocavam em frente, com a tralha nas costas.
Depois as monções navegavam os rios que levavam a Cuiabá. Então, mais uma vez, a preocupação não eram os buracos, mas os rodamoinhos que se formavam nas águas encachoeiradas, ao longo do curso do Tietê.
Nos dias atuais, faz muitos anos que São Paulo mantém a velha tradição das ruas esburacadas. Temos buracos de todos os tipos, origens e tamanhos. Do menor a imensas crateras capazes de engolir automóveis.
Neste cenário, a rua Almirante Pereira Guimarães é um lugar interessante para assistir a briga entre a Prefeitura e os buracos. A prefeitura tapa e eles voltam. Ela cria enormes manchas de asfalto, os buracos surgem no meio do remendo. Ela faz ações pontuais, eles puxam o asfalto para baixo. E assim vamos, até agora com nítida vantagem para os buracos. Afinal, eles têm séculos de tecnologia.