A cor de teus olhos
Alguém reparou na cor dos olhos da menina parada no sinal, pedindo esmola, com ar triste e cara cansada?
Alguém prestou atenção e viu que eram verdes da cor das ondas do mar num meio dia de verão? Que eles eram lindos e ainda brilhavam, desafiando o cansaço e o desengano?
Quanta coisa essa menina viu nos seus poucos anos de vida? Quanto do lado feio e sujo do mundo marcou sua alma, para não falar em seu corpo?
A menina vende balas, mas poderia ser uma infinidade de outros produtos, legais ou ilegais. Para ela tanto faz. Não é ela quem determina o que tem que vender, nem define os porquês, ou as quantidades.
Ela recebe ordens e as cumpre sem discutir porque já apanhou demais para saber que dizer não pode ser a forma mais curto de descobrir a dor física e o sofrimento do corpo levando porrada.
A dor moral, esta vem a cada noite ou a cada madrugada, quando algum barulho estranho a acorda e ela se levanta e pisa no chão frio de um barraco ou de uma praça, tanto faz, com os olhos pesados, mas atenta porque a vida não tem hora para pegar pesado.
Então, enquanto espera, se lembra dos desenganos e desventuras que são parte de sua rotina, às vezes, mais mansa, outras mais pesadas, mas sempre dura e fora de seu controle.
Ela sabe que a mulher encostada no barranco da praça, atrás da esquina onde pede esmola, não é sua mãe. Mas para todos os efeitos é como se fosse. Para uso próprio e alheio, porque a mulher bate nela como se fosse a mãe que a alugou, e os outros não têm nada com isso.
Qual é a cor dos olhos da menina parada ao lado da sua janela?
Siga nosso podcast para receber minhas crônicas diariamente. Disponível nas principais plataformas: Spotify, Google Podcast e outras.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.