O pedestre é o rei
Durante cem anos, o titular absoluto, o dono da posição, foi o automóvel. As ruas e estradas do país eram dele e os motoristas faziam o que queriam, acima do bem e do mal, regulados apenas por um Código de Trânsito levado pouco a sério e por guardas na cidade e nas estradas, quase todos de algum modo bastante compreensivos.
Ao longo do caminho foi preciso dividir os espaços com os ônibus e caminhões, mas nada que não desse acerto, num acordo mais ou menos amplo, onde o único que não tinha vez era o pedestre.
O pedestre era um estorvo. Atrapalhava a fluidez das ruas, tirava a atenção do motorista e ainda por cima era atropelado, o que virava uma amolação, porque o motorista tinha que responder a inquérito e às vezes até a um processo.
Alguns anos atrás, a coisa mudou. Alguém decidiu que era hora do pedestre assumir o comando e se tornar o grande personagem das ruas e avenidas.
Assim foi feito e, pasme!, mesmo sendo Brasil, a coisa deu mais ou menos certo. O pedestre primeiro passou a ser respeitado, depois tomou conta das ruas e, finalmente, se tornou rei. O Rei das ruas é o pedestre.
Acima do bem e do mal, da mesma forma que os automóveis 50 anos atrás, o pedestre hoje pode tudo, tanto faz o quê e como.
Atravessa a rua onde quer, não espera o semáforo abrir, anda na rua como se fosse calçada e ainda faz todo tipo de falta de educação se o motorista reclama porque ele está fazendo o que não é para fazer…
“Você sabe com quem está falando? Eu sou o pedestre. Faço o que quiser, na hora que quiser, e o senhor faça o favor de me respeitar”.
O que o pedestre ainda não percebeu é que, numa batida, entre a lata do carro e a carne do seu corpo, vai doer sempre mais nele.