Magia no vidro
Eu não sou fã incondicional da obra do arquiteto Oscar Niemeyer. Confesso que não gosto de vários de seus projetos, começando pelos Palácios do Planalto e Alvorada em Brasília. Também não gosto dos edifícios dos Ministérios. Todos de vidro, sem ar-condicionado central, eles teriam alguma chance de funcionar na Suécia ou na Islândia, mas nunca no planalto goiano, numa zona de sol intenso quase que o ano inteiro.
De outro lado, ainda em Brasília, a Catedral é a vingança perfeita. É um monumento que transcende a construção para em seu jogo de luz, aproximar o ser humano de Deus. É das igrejas mais belas do mundo, incluídas as grandes catedrais góticas.
Da mesma forma, se os edifícios dos Ministérios não são belos, nem funcionais, o prédio do Itamarati é uma obra de arte, uma escultura viva, realçando o talento incrível que gerou seu projeto.
Também não sou admirador incondicional do Memorial da América Latina. Suas linhas arredondadas e seus espaços vazios não me comovem.
Em compensação foi lá, me lembro como se fosse hoje, em outubro do ano de 1992, que vi uma das imagens mais bonitas de toda minha vida.
Sei que foi outubro de 1992 porque estava começando a Crônica da Cidade e escrevi uma crônica deslumbrada por conta do que eu vi.
Parte da estrutura do prédio era de vidro. Chovia e era de noite. Os pingos caindo, iluminados por dentro, reproduziam o universo em movimento. Cometas corriam entre as estrelas, enquanto os planetas giravam em volta delas, numa dança mágica e deslumbrante que nunca mais vou esquecer. Se foi de propósito ou não, não sei.
Mas ali, Niemayer, com a ajuda da chuva, criou sua obra mais bela.