O buraco malvado
A senhora vai andando pela rua da moda, olhando as vitrines cheias de tentações irresistíveis, quando, de repente, pleq! O barulho vem como um aviso do ato seguinte, quase imediato ao pleq, o desequilíbrio, o tropeção, o tombo e o joelho esfolado, saindo pela meia rasgada.
Foi mais uma vítima inocente do buraco malvado que se instalou na calçada da rua fina, disposto a explorar outras possibilidades, além das tradicionalmente trabalhadas pelos milhares de buracos que infestam a cidade de São Paulo.
Alguns buracos têm noção do próprio tamanho, outros são megalomaníacos. A diferença entre eles é que os primeiros costumam ser mais bem sucedidos, como mostra o pleq e o tombo, acima.
O buraco da calçada, pelo tamanho quase insignificante frente às grandes crateras de São Paulo, se estivesse numa rua não faria nada, não serviria ao menos para o carro cair dentro e dar um pulo um pouco mais alto, só para assustar o motorista. Mas, na calçada da rua fina, ele é terrível. É o dono do pedaço, o malvado, o cruel, o sádico que se diverte assustando e derrubando senhoras e senhoritas, que passam por ele vendo as vitrines.
E isso faz sua fama na comunidade. Ele é tão respeitado quanto as grandes crateras, algumas capazes até de engolir veículos inteiros. Pequeno, o buraco da calçada soube escolher o cenário ideal para transformar sua deficiência em habilidades que pudessem otimizar sua missão, e causar o máximo de dano aos odiados seres humanos que, quando sobra tempo e dinheiro, procuram tapar seus amigos e familiares.
Mas lá vem outra moça, vendo as vitrines. O buraco sorri, sua forma, alongada, na transversal, é perfeita, em breve a moça também vai cair.
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