As quaresmeiras estão floridas

Ano estranho. As quaresmeiras estão floridas, a quaresma está em curso, a Páscoa chega em menos de quarenta dias e, no entanto, o começo de tudo não foi o silêncio do surdo, depois de quatro dias de folia.

Esse ano não teve batucada, blocos nas ruas e desfiles de escolas de samba. Os dias de carnaval foram dias normais, como se a festa que faz a fama do Rio de Janeiro no resto do mundo fosse coisa do passado distante ou nunca tivesse existido, apenas uma lenda como o Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda.

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Tem quem já diga que Portela e Mangueira, União da Ilha, Estácio e Salgueiro são apenas invenções da mente, sonhos coletivos maravilhosos, mas apenas sonhos e que, na prática, no chão duro batendo na suspensão do ônibus, nunca existiram, meros contrapontos à Cuca e à Mula Sem Cabeça. Invenção do Saci para agastar a Iara e o Negrinho do Pastoreio.

As quaresmeiras estão floridas e falam dos sacrifícios da quaresma, da obrigação de não comer carne e jejuar pelo martírio do Cristo. Isto é, sempre foi assim. Este ano mudou tudo. As quaresmeiras estão floridas, mas não teve carnaval e, por mais que digam que a festa é lenda, não é.

No passado, até o ano passado, o carnaval era o divisor de águas. No antes o Brasil estava de férias, no depois o Brasil começava a trabalhar.

Mas veio a pandemia, o vírus que não gosta de festa e quer o mundo cinza, sofrendo e trancado dentro de casa, atrás das máscaras que escondem o sorriso. Veio a tristeza e o desamparo.

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Agora, é vez das quaresmeiras e elas estão floridas porque estão floridas. Todo ano é igual, mas este ano as cidades não estão iguais, nem as pessoas.

As quaresmeiras estão floridas, mas a florada não é para anunciar a ressurreição do Cristo, é para dizer que não é hora de entregar os pontos.

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