O comitê da sardinha
D. João VI sorriu no seu caixão. Afinal, depois dele foi a primeira vez que alguém se preocupou seriamente com o problema da sardinha no Brasil. Ao contrário do que muita gente pensa, o rei português estava longe de ser um imbecil. Na longa história dos reis, poucos monarcas tiveram a capacidade de sobrevivência do filho de D. Maria I.
É olhar sua obra no Brasil, começando pelo jardim Botânico do Rio de Janeiro, para se ter certeza de que imbecil ele não era. E se lembrarmos as outras coisas que fez e pensou, antes de retornar para Portugal, veremos que era um bom analista político e que sabia que a independência do Brasil era só uma questão de tempo, tanto que alertou seu filho, o príncipe D. Pedro, para dar o passo, antes que outro o fizesse.
Mas o que poucos sabem é que o rei foi das primeiras pessoas a se preocupar com os pobres do país. D. João VI sabia que os pobres e os escravos tinham mandioca e banana em quantidade, mas que só a caça não era suficiente para garantir-lhes carne para uma alimentação de boa qualidade. Sua solução para o problema foi genial: mandou povoar a costa brasileira com sardinhas, para assim, por um preço muito barato, complementar a alimentação dos pobres e escravos com a carne do peixe; além de criar empregos para pescadores em todas as províncias da terra.
Daí em diante, o pobre sempre foi tema de tese de intelectual de esquerda e de campanha política, mas na prática pouca gente fez o que o gordo rei português efetivamente fez.
Essa situação ameaçava mudar e por isso sua majestade estava rindo dentro da cova: o comitê interministerial de gestão da sardinha iria dar certo e salvar o peixe. Só que desde que ele foi instalado – e já faz tempo – ninguém ouviu mais falar dele.
___
Siga nosso podcast para receber minhas crônicas diariamente. Disponível nas principais plataformas: Spotify, Google Podcast e outras.
Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.