Silêncio

Quanta distância no enorme silêncio abafado pelo barulho da cidade grande. Quilômetros, milhas, anos-luz, nos separam e nos afastam, como se o silêncio nascido do vento tivesse o dom de cortar todas as amarras e com velas pandas, afastar os navios do cais.

Triste silêncio que me toca no fundo do peito, como uma faca abrindo a veia por onde corre a vida, ou a sua alegria.

Silêncio lunar, de lua cheia no mato espantando a caça e trazendo pra perto a possibilidade de todas as assombrações.

Quero correr, mas a incerteza me prende e tento me agarrar ao barulho dos carros se arrastando lá fora como a última taboa de salvação, o bote adernado onde me escondo do sol, dos peixes e do sal.

Silêncio de náufrago escutando o vento e as ondas que lhe contam dos navios que não vêm. Silêncio de tocaia, de espera pelo momento que ainda não aconteceu, de pré-aviso de terremoto.

A cidade segue impassível em sua cacofonia alucinada, sinfonia dodecafônica, onde cada instrumento é a representação viva de um ruído que se alastra até o outro lado do mundo, repetido, repetido, repetido, numa monótona toada de carro de boi, elevada ao infinito.

Dentro é só o silêncio. O silêncio que não explica as causas, mas reafirma os finalmentes.

O silêncio que segue à lágrima, que vem depois da dor, ou do susto, que é a dor da alma.

A distância não tem bordas, nem parâmetros. Simplesmente existe, absoluta, imperativa, onisciente.

Somos conscientes dela e de tudo que significa. Do perigo e da emoção. Do sonho desfeito e da lua sobre a mata.

Mas, lá longe, surge outra madrugada, carregada de espanto e nela minha alma reencontra a vida.

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