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Calçadas

Não há, oh, não, calçadas como as calçadas das cidades brasileiras! Cada buraco é um convite para mergulhar na escuridão, cada fresta uma viagem e a pedra fora de lugar, a certeza da queda.

Nas calçadas da vida desfilam tragédias, comédias, dramalhões, olhos se encontram, mão se abrem, abraços não se completam; nas calçadas da vida, toda as possibilidades são mera esperança, acontecem ou não, na velocidade do pensamento ou na demora da morte.

Não há duas calçadas iguais, nem mesmo semelhantes. Até as que são feitas com lajotas padronizadas fogem do padrão na instalação mais bem-feita, na instalação malfeita, na pedra levantada, no cimento mal colocado.

Cada trincheira é única, cada vala é diferente da outra, cada tombo esborracha nas pedras o pensamento que voa alto.

Não há calçada como as calçadas de Uberaba. Foram feitas para impedir a passagem dos cadeirantes, com os postes colocados de forma a não permitir que sejam contornados, por um lado ou pelo outro.

Mas se as calçadas de Uberaba merecem citação expressa, não quer dizer que outras calçadas espalhadas pelas milhares de ruas do país não sejam tão ruins quanto elas e só esperem um poeta para cantar os versos de sua enorme tragédia.

As calçadas brasileiras servem de parâmetro para o enorme descaso de cada um com seu próximo. Se são os governantes os responsáveis pelas calçadas do mundo, são os eleitores que escolhem seus representantes.

Se eles não se preocupam com as calçadas, os eleitores não se preocupam com eles, mas votam neles mesmo assim, sabendo que não tomarão conta das calçadas, como não tomarão conta de quem precisa, nem se preocuparão com o bem-estar do povo. Ora, o povo!

 

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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.

Antonio Penteado Mendonça

Advogado, formado pela Faculdade de Direito Largo São Francisco, com pós-graduação na Alemanha e na Fundação Getulio Vargas (FGV). Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (2017/2020), atual Irmão Mesário da Irmandade, ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras, professor da FIA-FEA e do GV-PEC, palestrante, assessor e consultor em seguros.