Os ciclos se fecham
As jabuticabas acabaram, as pitangas ficaram para trás, as amoras sujaram as calçadas e os sabiás já não piam tanto de noite. Agora seu canto é de dia, enquanto as aves ciscam pelos jardins, atrás da comida nossa de cada dia.
O frio veio, o calor veio, o frio voltou e já passou… é assim porque é assim. As estações se sucedem e a vida segue em frente, no ritmo de cada vida, no comprimento de cada existência, umas mais longas, outras mais rápidas, ninguém sabe o porquê.
Os dias nascem no sol que surge de trás da noite e traz consigo a primeira luz de uma ameaça de madrugada. Ainda não é claro, mas já não é a iluminação da cidade abrindo os horizontes para quem vive na noite. Ou quem vive da noite. São coisas diferentes e que não se confundem e a luz da cidade serve para balizar as fronteiras, não permitindo que alguém desavisado as cruze, como se fosse no pasto, ver se os animais estão bem.
Sei de mim, mas não sei de você. Você, como diria o grande filósofo William Scott Pitt, você, para mim, é problema seu.
Retrato de um Brasil mais duro, mais insensível, cruel feito faca cortando o dedo da cozinheira. A solidariedade está escondida em algum buraco, esperando um sol mais amável nascer no horizonte de um dia, hoje ainda distante.
A cidade amanhece nas cores cinzas de seus muros pichados, de suas calçadas ocupadas por barracas, de cobertores enrolando sonhos que fogem e escorrem pelas ruas.
As árvores que floriram o mês já passado perderam suas flores. As árvores que agora estão floridas são outras – flamboyants e espatódias substituem os ipês e as sibipirunas. É assim porque é assim. Cada dia tem seu ciclo e o ano se fecha na soma de todos eles.
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Crônicas da Cidade vai ao ar de segunda a sexta na Rádio Eldorado às 5h55, 9h30 e 20h.