Tua distância
Tua distância tem cheiro de vento sul, de frio rompendo a pele e gelando a alma.
Tua distância sabe a farol apagado, deixando de conduzir as embarcações pela rota segura da entrada do porto.
Tua distância é como a noite escura em que nos perdemos e perdemos os rumos e a certeza do caminho.
Tua distância é o grito preso na garganta, a gargalhada que não explode, o silêncio esmagando o riso.
Tua distância é a encosta do morro queimada, sem vegetação, triste, cinza e negra, na fuligem onde antes era capim.
Tua distância é o pesadelo que se abate sobre meu dia e transforma o azul do céu em tempestade de granizo.
Tua distância sabe a solidão, falta de vontade de tocar em frente, barranco ou erosão que interrompe a estrada.
Tua distância é a imagem dos dinossauros refletida no último sol de Andrômeda.
Tua distância é tudo que poderia ter sido e que não foi. Leve esboço rabiscado nas costas de um guardanapo.
Tua distância é o carro quebrado na subida da serra, o telefone que não toca e o silêncio na sala.
Tua distância é o sonho não sonhado, a noite acordada e o frio que entra pelas frestas do cobertor.
Tua distância é tudo o que deveria ter sido, mas que não foi. O dia que não seguiu a madrugada e a noite que não caiu no fim da tarde.
Tua distância é a incerteza de não ter mais cor no fim do arco-íris. Da música ter sido engolida pela cachoeira. De tudo nunca mais ser.
Mas você está próxima, de mãos dadas, caminhando ao meu lado.
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